As práticas de lawfare trouxeram não só ao Brasil, mas a todo o mundo, um novo patamar de desafios categóricos à luta pela democracia. O primeiro deles é a luta pela sobrevivência da própria democracia, para que esta última não se torne apenas um simulacro de aparentes disposições e conjunturas, onde se asfixiam os Direitos Humanos com requintes de (falso) republicanismo. Outro desafio é aglutinar forças para a luta em um campo de batalha minado por malfeitores, estes últimos que se revelam a cada dia não apenas como erráticos (wrongdoers), mas também como malévolos (evildoers).
A conscientização e o engajamento em torno do debate do lawfare é pela volta da paz, da justiça e, sobretudo, da legitimidade moral às instituições. É um debate que está abrigado na cláusula 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável acordados pelas Nações Unidas, para serem respeitados até 2030. Jogar luz sobre as instituições a fim de torná-las mais transparentes e democráticas visa alcançar o bem-estar de todos a partir da representatividade dos interesses verdadeiros da sociedade, e não de grupos de poder carregados até os dentes para disparar uma vontade política inescrupulosa, orientada pela ganância e apoiada pelo cometimento de injustiças direcionadas a determinados inimigos.
O cenário de guerra criado pelo lawfare se reproduz na linguagem baseada nos espectros dualísticos do bem contra o mal, da direita contra a esquerda, do conservador contra o progressista, do comunista ameaçador e do anticomunista cristão. Uma linguagem que reflete a dialética tautológica da filosofia do impossível. A acepção e a apropriação da retórica se impõem de cima para baixo, causando o conformismo manipulado das massas e uma torrente de desinformação midiática como arma de guerra. O debate é taxado e censurado. A tortura reaparece. A democracia padece. O país afunda. O povo empobrece e morre.
No Brasil, a pandemia deixou um saldo de mortes que demonstra o quanto o lawfare pode justificar o inexplicável em uma escalada genocida. Antes disso, o combate à corrupção pelo viés da ameaça aos direitos, por sua vez, credenciou mensalão e petrolão à criação da Operação Lava Jato como a maior ameaça histórica à Constituição Cidadã e à legitimidade e credibilidade do Poder Judiciário. Neste cenário de tabuleiro de xadrez misturado com jogos de azar, as práticas de lawfare fizeram e fazem os cidadãos comuns se dobrarem diante de um Estado dominado pela tirania de uma minoria, que promete e não cumpre; vê e finge que não vê; escreve e desdiz; privatiza o que é público; desgoverna e destrói.
LAWFARE NUNCA MAIS
O professor Osmar Pires Martins Junior, organizador e coautor das obras Lawfare Sob Debate (Editora Kelps, 2020) e Lawfare – An Elite Weapon for Democracy Destruction (Editora Egressos, 2021), participou de debate on-line, nesta terça-feira, com os debatedores Cleide Martins, Sandra Urech e Henrique Pizzolato, da rede “Lawfare Nunca Mais”. O professor Osmar Pires Martins Junior, da UFG, tem se destacado como estudioso das práticas de lawfare no Brasil e no mundo. Ele é um dos idealizadores da campanha #lawfare4all, para a internacionalização do debate sobre o lawfare (ver website). A rede “Lawfare Nunca Mais” teve origem no Fórum Social Mundial Justiça e Democracia, realizado em Porto Alegre, em abril. Na mesma oportunidade do debate sobre o tema “Para que o lawfare não se repita”, a Rede Pelicano de Defesa dos Direitos Humanos foi convocada ao vivo para fortalecer o debate sobre a criação de instrumentos legais que coíbam as práticas de lawfare (assista aqui).