Ao longo dos anos, diversas serventias extrajudiciais vêm acumulando atribuições notariais e registrais, mesmo algumas sendo altamente rentáveis. Isso, de certa forma, viola os artigos 5º e 26 da Lei n.º 8.935/1994. Por este aspecto, o Conselho Nacional de Justiça, ao inspecionar o Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas (auto circunstanciado de inspeção preventiva, Portaria n.º 113/2009), concluiu na página 32 que:
“[…] A acumulação dos serviços de registro de imóveis com a atividade notarial, como sempre, mostra-se imprópria e capaz de produzir desvios, uma vez que os usuários preferem o notário, que também fará o registro, aos demais, que poderão ter seu título recusado pelo registrador. Ao mesmo tempo o registrador, que lavra também o título, fará o registro mesmo que o ato não atenda à legalidade estrita, uma vez que, por ter sido o responsável pela lavratura do título, jamais recusaria o seu registro….”. Disponível em: https://cgj.tjal.jus.br/_pdf/cnj/relatrio_inspeo_alagoas_final.pdf
Por outro lado, podem surgir dúvidas sobre um suposto direito adquirido em manter atribuições notariais e registrais fora das hipóteses previstas nos artigos 5º e 26 da Lei n.º 8.935/1994.
Em consulta realizada com especialistas na matéria, não existe direito adquirido do titular de serventia em manter atribuições outorgadas pelo Estado. Os administrativistas citam a decisão do STJ no RMS 17116 RS 2003/0181356-7:
“Além de ser expressamente vedada a acumulação de serviços por força do artigo 26 da Lei nº 8.935/94, que revogou toda e qualquer norma estadual autorizativa definitiva, e fora da hipótese de baixo volume de serviços ou receita, à luz do que dispõe o enunciado nº 46 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, os cartórios extrajudiciais podem ser desmembrados, anexados a título precário, ou desanexados, a qualquer momento, a critério da Administração, não existindo direito líquido e certo em manter aglutinação.”
Somado a isso, o Conselho Nacional de Justiça, em diversos processos administrativos, vem mantendo esse posicionamento, como se lê na decisão proferida no processo n.º 0000384-46.2007.2.00.0000:
“Não são acumuláveis os serviços notariais e de registro, exceto nos municípios que não comportam mais de um dos serviços, em razão do volume de serviços ou da receita, visto que a anterior legislação permissiva dos estados sobre a matéria não foi recepcionada pela Constituição Federal, nem pela Lei Federal nº 8.935/94, que regulamentou o art. 236 daquela Carta de Princípios.”
A acumulação de atribuições notariais, registrais e de protesto de títulos tem chamado a atenção em alguns Estados do Brasil.
ÉTICA X LEGALIDADE
Sob outra perspectiva, surgem também questionamentos relacionados à livre pactuação na cobrança de emolumentos. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por meio da Lei Estadual n. 14.605, de 5 de janeiro de 2010, tem permitido que os tabelionatos “pactuem” a cobrança de emolumentos nos atos notariais. O assunto está disciplinado no art. 17 da Lei Estadual n. 14.605/2010 com a seguinte redação:
“Art. 17. Os tabelionatos poderão pactuar livremente seus emolumentos, observada a tabela do Tribunal de Justiça e a Lei Federal nº 8.935, de 18 de novembro de 1994.”
Disponível em https://www.tjce.jus.br/wp-content/uploads/2015/08/Lei_14605_2010.pdf
A questão da “livre pactuação” sobre a cobrança de emolumentos tem gerado debates e questionamentos diversos quanto à ética e legalidade.
Na visão da Ativista de Direitos Humanos Juliana Gomes Antonangelo, a legislação de iniciativa do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará parece entrar em conflito com as determinações do Conselho Nacional de Justiça, em particular o que é estabelecido pelo Provimento CNJ n. 45/2015, que proíbe a prática de cobrança parcial de emolumentos:
Art. 7º É vedada a prática de cobrança parcial ou de não cobrança de emolumentos, ressalvadas as hipóteses de isenção, não incidência ou diferimento previstas na legislação específica. Disponível em https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2508
O tema é polêmico e espera-se que a ética e a legalidade estejam alinhadas, ou seja, que as leis se fundamentem em critérios éticos e que as ações éticas sejam respeitadas pela legislação.
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