A complexidade do emprego do termo “paridade de armas”, no âmbito da Justiça, pode encontrar na debate sobre as práticas de lawfare interessante argumento à pacificação e ao fortalecimento das instituições do sistema legal. Buscar a simplificação do debate, neste caso, equivale a um esforço de ampliação do entendimento de que a questão do lawfare não é somente uma questão que envolve a Justiça, mas sim que tem a ver com a injustiça e atinge a todos brasileiros.
Nem tudo que é injusto é lawfare, mas toda prática de lawfare resulta em injustiça. Por isso, quando as garantias legais e a defesa dos direitos humanos são ameaçadas, o que fica mais nítido quando a Constituição do País não é respeitada, a injustiça é produzida objetivamente, assim como o lawfare. Por quê isso acontece em todo o mundo e no Brasil já é possível observar um quadro epidêmico de contágio da Justiça pelo lawfare?
A resposta à pergunta anterior está na paridade de armas. No lawfare, as forças que potencialmente têm o poder e até o dever de mover a sociedade para um futuro mais justo, assumem a posição de dosar esse desenvolvimento, de forma não progressista e conforme as suas prerrogativas. Essas forças têm dominado o cenário brasileiro, em todos os poderes da república. Por outro lado, liderados pelo inconformismo com as injustiças que são perpetradas no presente e planejadas para o futuro, surgem grupos e movimentos que se veem enfraquecidos pela ausência de paridade de armas.
Só para ficar em um exemplo bastante notório sobre a necessidade de paridade de armas, temos o bravo histórico de lutas e a realidade atual da Defensoria Pública, que teve, no dia 19 de maio, a passagem de seu Dia Nacional. De acordo com o Dicionário do Direito, a função da Defensoria Pública é prestar a orientação jurídica, promover os direitos humanos e defender os direitos individuais e coletivos, de maneira integral e gratuita, às pessoas que necessitem desses serviços e não possuam condições de arcar com eles.
Com essa missão pela frente, acredite se quiser, até recentemente, uma das mais preocupantes reivindicações da categoria ainda era por condições de trabalho para poder exercer suas funções! Faltava de tudo, de cadeiras à máquina copiadora. No Brasil, existem cerca de 13 mil promotores e procuradores públicos, segundo o Anuário do Ministério Público Brasil 2020. Conforme o Ministério da Justiça, o número de Defensores da Justiça não chega à metade disso: seriam apenas 6.235 trabalhando no Brasil. Chega-se a números absurdos em Goiás, onde há um defensor público para atender cerca de 70 mil pessoas, ou no Paraná, onde a expectativa de atendimento é de um defensor para cerca de 85 mil pessoas.
De acordo com informações da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos em parceria com o IPEA, cerca de 82% da população brasileira se enquadra nos critérios para requerer serviços da defensoria pública. Das 2.762 comarcas existentes no Brasil, 1.162 contam com defensores públicos, o que equivale a 42% do total. “Esses dados são mais do que suficientes para que a população brasileira, especialmente, as milhões de pessoas carentes que precisam de advogados e não podem pagar por esses serviços, tenham consciência de que há um evidente desequilíbrio de forças no sistema jurídico”, lembra a advogada, Juliana Gomes Campos, da Rede Pelicano de Direitos Humanos.
Guardadas as devidas proporções, nota-se que no Brasil a defensoria pública ainda é tratada como um grupo de escoteiros que têm a missão de fazer o bem àqueles que conseguem o devido acesso a esses profissionais. Pela paridade de armas, a Defensoria Pública merece e precisa ser valorizada e ganhar respaldo da população para tornar mais justa a Justiça e menos injusta a realidade social. Sem isso, o lawfare avança como um tanque de guerra sobre o território onde se nota a ausência do Estado e de suas instituições. Vai esmagando direitos e eliminando inimigos estratégicos pelo caminho.